Amamentação Sem Mitos

Esse não é um texto contra as mães que não amamentam

Por Viviane Laudelino Vieira

Ontem, a apresentadora Fernanda Gentil postou no seu Facebook um relato falando das dificuldades que teve com a amamentação, do sofrimento gerado por elas (que entravam em conflito direto com aquilo que idealizava na amamentação) e das pazes que fez consigo mesma por ter deixado de amamentar e passado a usar fórmula. Mulheres que se identificaram com Fernanda se solidarizaram a ela, enquanto que, qualquer comentário contrário a um apoio foi devidamente massacrado.

 

imagem de internet

Além do seu relato, desconheço qualquer outro detalhe da sua história e da sua maternagem. Coincidentemente, há algum tempo, venho pensando mais nas mulheres que, por algum motivo, deixaram de amamentar. Elas são invisíveis nas políticas públicas de saúde (por consequência, seus bebês também são) e, então, cada profissional conduz da forma como julgar melhor.

Mas, mais do que somente pensar no momento em que o desmame se estabeleceu, me intriga o caminho que foi percorrido para isso. O relato da Fernanda é um exemplo disso. Ela, como muitas mulheres, acreditou que amamentar era algo automático. Eu também acreditei nisso e quase cai em uma armadilha. Provavelmente, um dos pontos que me protegeu foi que, apesar de não ter me preparado para amamentar, o assunto não era algo distante de mim, tendo em vista a minha profissão. Mas, definitivamente, em uma realidade onde estamos cercados de informações contraditórias, com mamadeiras e chupetas à disposição, maternidades despreparadas e pressão da indústria de alimentos, estamos muito vulneráveis para ter a amamentação fluindo tranquilamente. Não sei se ela teve cesárea. Eu tive. E minha filha levou cerca de seis horas para chegar até mim e mamar (ou tentar) pela primeira vez. Nisso, o automático já foi embora. E aí, eu poderia exemplificar dezenas de outras situações comuns que vão aumentando o tamanho da nossa barreira para a amamentação ocorrer. Enfim, lamento por ela e por todas que acreditaram que seria muito simples. Para aquelas que ainda amamentarão, fica o alerta. O melhor preparo é muita informação.

Além dessa idealização da amamentação, a apresentadora trouxe aquilo que ela entende que eliminou sua chance de amamentar: mamilo invertido, prótese, redução de mama, dor, leite que não desce, leite que seca… Enfim, uma sequência de nós. Poderiam ter sido desfeitos? Agora, é muito difícil saber (apesar de que, tendo em vista que o desmame é recente, uma relactação é possível, caso ela deseje). Um a um, todos esses pontos podem dificultar, mas não são situações que eliminam a chance da mulher amamentar. No seu relato, em nenhum momento a Fernanda falou sobre o apoio e orientação que teve nesse período de dificuldade. Foi um texto falando da sua luta, do seu sofrimento, da sua frustração e da sua culpa. Quem será que a apoiou? E como a apoiou? Teve contato com profissionais pró-amamentação (que são a minoria) ou com aqueles que minam sua confiança, enaltecendo ainda mais o formato do bico como “inadequado”, não ajudando a corrigir a pega (que provavelmente a levou à dor), reforçando que ela não tem leite? Com todas essas situações já estabelecidas relacionadas às suas cirurgias, se o bebê não estiver mamando em livre demanda, fazendo uma pega adequada (e a pega correta envolve a aréola, não somente o bico, sendo real a possibilidade de amamentar tendo o mamilo invertido) e sem uso de outros bicos, é praticamente impossível não ter produção de leite. Para o leite existir, precisa de estímulo do bebê. E precisa de uma mãe tranquila e confiante. Além disso, a apojadura (quando o leite “desce”), acontece dias após o nascimento e, mesmo antes dela acontecer, existe o colostro que, mesmo que pareça insignificante em quantidade, é fundamental ao bebê (e somente com o bebê mamando o colostro, terá o estímulo para a apojadura acontecer).

Esse texto não é para criticar a Fernanda ou para vitimizá-la. Ele vem com o intuito de alertar as próximas mães ou aquelas que estão vivenciando a amamentação de forma conturbada. As situações colocadas pela Fernanda não necessariamente levam ao desmame. Mas o isolamento, a falta de apoio e de orientação adequada PODEM levar ao desmame.

E, para não esquecermos o motivo pelo qual lutamos para que o desmame não aconteça de forma precoce: por mais que a indústria apresente fórmulas modificadas, o leite materno é comprovadamente o melhor alimento para ser dado ao bebê!

Acesse aqui o texto que fala sobre como se preparar para amamentar ainda na gestação.

3 Comments

  • Fiquei preocupada quando li o post da Fernanda e estarrecida com os comentários!
    Preocupada por uma pessoa pública relatar e afirmar uma naturalidade nesta solução encontrada.
    E estarrecida qdo uma especialista em relactação respondeu afirmando que ainda havia esperanças e explicando de que forma poderia ser feita, caso ela desejasse e ela foi duramente criticada, como se não estivesse respeitando a dor daquela mãe… Abaixo ainda havia alguns poucos comentários recomendando essa especialista, que foram ignorados.
    Me assusta ver como a sociedade se comporta, achando normal o artificial e considerando agressão uma ajuda oferecida!
    Informação + Informação + Informação. Esse é o caminho e a nossa Saúde Pública ainda engatinha em muitas coisas!
    Parabéns pela análise Vivi! Temos que fazer nosso papel!

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