Alimentação e Nutrição Infantil

Bebês podem tomar suco?

Por Viviane Laudelino Vieira

O tema do post de hoje é sucos e introdução de alimentos. É muito comum a prescrição médica para se iniciar a introdução de alimentos dando uma pequena quantidade de suco natural ao bebê, normalmente, de laranja lima. Mas, qual a justificativa dessa recomendação?

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Um bebê, para iniciar o período de alimentação complementar, precisa se adaptar a novos alimentos. Enquanto o ato de sugar é instintivo, mastigar e deglutir alimentos requer aprendizado e demora meses. Com o suco, o bebê terá contato com um novo alimento, mas ainda na forma de líquido. Muito provavelmente, ela conseguirá consumir essa fruta de forma muito mais fácil quando comparamos a algo sólido. Além disso, a laranja lima é adocicada e suave. O leite também apresenta sabor adocicado e o ser humano, naturalmente, tem um paladar muito receptivo a doces. Mais um motivo para bebês tão pequenos aceitarem os sucos com muita facilidade!

Apesar disso, a Sociedade Brasileira de Pediatria traz a seguinte recomendação: “Os sucos naturais devem ser evitados, mas se forem administrados que sejam dados no copo, de preferência após as refeições principais, e não em substituição a estas, em dose máxima de 100 mL/dia, com a finalidade de melhorar a absorção do ferro não heme presente nos alimentos como feijão e folhas verde-escuras”.

Agora temos um dilema! Por que se recomenda evitar os sucos mesmo sendo algo que o bebê aceitará tão facilmente?

A primeira justificativa está nessa questão de ser um alimento “tão fácil”. Já comentei em outros posts e sempre falo disso nas minhas consultas: a introdução de alimentos apresenta diversas finalidades. Uma delas é a de nutrir o bebê, mas, igualmente importante, ela serve para a formação dos hábitos alimentares, para o desenvolvimento da fala, fortalecimento da musculatura da face, socialização, desenvolvimento motor… Quando eu dou um suco ao meu bebê, eu limito muito as experiências que ele está tendo com o alimento. Ele só precisará beber e não poderia pegar o alimento com as mãos ou ter o desafio de experimentar uma diferente textura ou de tentar amassar algo com suas gengivas ou dentes. As frutas in natura, por sua vez, são extremamente diferentes entre si e oferecerão uma variedade enorme de experiências à criança! Poder vivenciar isso desde o começo, é um grande aprendizado para os bebês!

Voltando ao valor nutricional, o suco de frutas é feito de quê? O maior componente é a água, seguida da frutose, que é o carboidrato que dá o sabor adocicado à fruta. Também terá vitaminas, mas é importante lembrar que muitas vão se perdendo à medida em que entram em contato com a luz e com o ar. As fibras, responsáveis pela formação do bolo fecal, também ficam muito mais restritas na bebida. Nesse sentido, podemos nos deparar, pelo menos, com duas situações. A primeira é para aquele bebê que ainda não criou simpatia pelos alimentos. Ele poderá preencher o volume do seu estômago com o líquido e, assim, perderá a motivação para comer os alimentos sólidos. Uma outra situação é daquele bebê que se adapta tão bem ao suco (substituindo a água), independente do alimento sólido, e ingere quantidades elevadas, ocasionando ganho de peso excessivo (que pode ser revelado somente no futuro), além de aumentar a chance de desenvolvimento de cáries. Vamos pensar: quantas laranjas são necessárias para fazer 200mL de suco? Provavelmente, três. Quantos bebês com menos de um ano conseguem comer 3 laranjas consecutivas? Serão pouquíssimos. Mas, provavelmente, a maioria conseguiria beber um copo pequeno de suco. E em poucos minutos. Quanto maior a frequência dessa ato, mais estamos condicionando a criança a usar bebidas que possuem algum sabor, na maioria das vezes, com frutose em uma quantidade superior a uma porção de frutas. E vale a pena lembrar que o consumo excessivo de frutose tem sido associado ao desenvolvimento da obesidade.

Além disso, sabendo que o bebê já irá gostar de substâncias adocicadas, se expusermos com mais ênfase, esse sabor a ele, a chance dele não simpatizar com o azedo e o amargo vai aumentar e, assim, seu repertório de alimentos diminui consideravelmente. Quanto maior for a variedade de alimentos oferecidos nesse período, mesmo quando a criança se tornar mais seletiva, ela ainda apreciará maior número de opções de alimentos e/ou, futuramente, terá mais chances de voltar a comer determinados alimentos.

Outro argumento usado para o consumo suco é a necessidade de hidratação da criança. Nesse momento, é importante ponderar o benefício desse ato. Dado que a recomendação é usar, no máximo, 100mL de suco, qual o seu potencial para hidratar o bebê? E é importante lembrar que, na maioria das vezes, o bebê ainda consegue se hidratar totalmente por meio do leite materno por algum tempo após o início da introdução de alimentos. Mesmo assim, recomenda-se que seja oferecida água para que ele possa beber. O suco não precisaria ter esse papel. E, mais uma vez, se acostumamos que o bebê se hidrate com suco, a chance dele rejeitar a água aumenta.

Aqui nesse post, somente estou falando de sucos naturais, ou seja, feitos exclusivamente da própria fruta e, no máximo, adicionados de água. Não estou entrando na questão do uso de açúcar para adoçar o suco, uma medida relativamente comum entre as famílias (“coitado… essa fruta é muito azeda”). Se suco deve ser evitado, suco com açúcar deveria passar mais longe ainda dos bebês. Também não estou falando dos sucos ou néctares industrializados, que acabam sendo opção em diversas situações, principalmente para as refeições do bebê fora de casa. Mais uma vez, alimentos industrializados também não devem fazer parte da alimentação de bebês.

Algumas pessoas provavelmente não concordarão com esse post, pois esse é um tema relativamente novo e confronta diretamente com aquilo que muitos de nós aprendemos e praticamos. Mas o texto serve para esclarecer melhor o assunto. Não estou falando de proibições, mas trago uma reflexão sobre alguns cuidados simples relacionados à alimentação infantil que podem contribuir para a sua saúde.

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