Amamentação Sem Mitos

Aleitamento materno e o direito humano à alimentação adequada

O Brasil avançou bastante nas últimas décadas a discussão sobre segurança alimentar e nutricional. Em 2006, o direito humano à alimentação adequada passou a ser assegurado por meio da Lei Orgânica no 11.346 e, desde 2010, a alimentação foi incorporada à constituição como um direito social, por meio da Emenda Constitucional no 64.
Porém, quando pensamos em toda complexidade relacionada à segurança alimentar e nutricional, que considera questões ligadas à cultura, sustentabilidade, qualidade, quantidade, soberania, dentre outras, raramente surge a amamentação dentro das discussões ligadas ao direito à alimentação.
Por que será que isso acontece? Estamos falando nada mais do que o primeiro alimento que qualquer ser humano deveria ter contato. E, mais do que isso, ao longo dos seus primeiros seis meses de vida, o leite materno representará o ÚNICO alimento necessário ao bebê. Em nenhum outro momento da sua existência, isso se repetirá com tal perfeição. Mais do que prover todos os nutrientes necessários para suprir as demandas decorrentes do intenso desenvolvimento, o leite materno oferecerá proteção imunológica para um organismo que nasce com poucos mecanismos de defesa já estabelecidos. Mais do que o leite materno, a amamentação representa a segurança, o acolhimento e o carinho para um ser que nasceu há pouco tempo e precisa ainda compreender o mundo em que se inseriu.
A amamentação é um direito reservado não somente ao bebê, mas à mãe. A ela, cabe o acesso a informações adequadas durante o pré-natal, o direito a um parto respeitoso e a ter contato pele a pele com seu filho nos primeiros minutos após o nascimento, além do apoio profissional frente a qualquer dificuldade e da sua família e entorno para conseguir praticar a livre demanda. Amamentar não representa a sobreposição do bem-estar da criança à vontade materna. O direito de amamentar significa que nenhuma força externa pode interferir de forma contrária à relação entre a mãe e a criança.
Devemos trazer à discussão que não estamos falando da amamentação como um luxo ou uma situação relacionada à sorte para uma parcela das mulheres. Mas, quando temos dados que mostram que 50% das mulheres amamentaram exclusivamente somente até os 54 dias de vida, sendo que o esperado seriam 180, fica evidente que temos um longo caminho a percorrer.
A prática do profissional da saúde, infelizmente, tem representado um dos pontos frágeis relacionados à manutenção da amamentação. Frente à limitação de espaços de educação permanente e uma formação ainda fragmentada que supervaloriza a realização de procedimentos complexos, realizar o manejo clínico da amamentação torna-se distante da realidade de médicos, enfermeiros, nutricionistas e tantos outros profissionais. Aliado a isso, temos uma forte influência da indústria que atua de forma massiva para o convencimento desses formadores de opinião quanto a ideias sutis, mas errôneas, de que o aleitamento materno pode ser facilmente substituído por outros produtos (industrializados) sem nenhuma desvantagem ao binômio mãe-bebê.
Garantir a amamentação é garantir alimento de verdade às crianças. Vamos ampliar os espaços de discussão sobre o assunto para que tratemos, efetivamente, esse ato como um direito a ser assegurado.
*Esse texto foi produzido originalmente para a
5ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
, ocorrida em 2015.

 

 

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