A Mulher, a Maternidade e a Criança

Relato do nascimento da Manu

Eu falo muito da minha filha! Mesmo! Ela vive inserida nos meus assuntos dentro e fora do blog de forma muito natural, digna de uma mãe babona e apaixonada que sou.

Agora, Manu está completando 3 anos! De longe, já é uma criança. Pula, cai, anda de bicicleta, patinete (em breve, skate…. para o desespero da vovó), briga, ri, abraça, fala “te amo”, me chama de “chata”. Temos uma relação de companheirismo a ponto de, em um dia em que não estava bem, ela ter vindo enxugar minhas lágrimas e me dar comida na boca. Que emoção ter gerado esse ser humano.

Mas nunca escrevi sobre o nascimento da Manu. Até hoje, não sei definir o sentimento que tenho em relação ao seu parto. Estava feliz no momento do seu nascimento, mas tenho ressentimentos por não ter feito muitas coisas diferentes para nós duas.

Já descrevi aqui que tivemos um início de gravidez conturbado. Passados os primeiros três meses, a gestação evoluiu tranquilamente. Claro que minha vida estava em amplo processo de mudança: estava em um ritmo intenso no trabalho e, ao mesmo tempo, com os preparativos para a chegada da Manu e procurando uma casa para construir a nossa família. Achada a casa, tivermos reforma que durou praticamente a gravidez toda, sendo que fomos nos mudar no último mês. Eu sofria achando que a Manu iria nascer em meio às caixas de papelão, sem ter seu quarto arrumado. Mal sabia que isso era o menos importante.

Ao meu modo, também procurei me dedicar a gravidez. Passei a fazer ginástica para gestantes no Sesc, que foi provavelmente a responsável por me fazer chegar ao final da gravidez sem dores nas costas (que tinha no começo da gravidez) e frequentei o grupo de gestantes do Espaço Nascente. Lembro que, logo no primeiro encontro, com a Tatiana Rodello conduzindo, ela me perguntou algo sobre o parto. Eu respondi que queria normal. Hoje já consigo imaginar o que deve ter se passado pela cabeça da Tati: “essa gestante precisa ainda aprender muito sobre parto”. E precisava. Ela foi bastante delicada ao falar sobre o assunto e me apresentar de fato o universo do parto humanizado.

Eu ficava em uma situação de dúvida: era extremamente agradecida à obstetra que tinha me acolhido em um momento tão frágil da minha gestação, abrindo exceções para me receber tão prontamente. Porém, ela era vaga nas suas respostas sobre o parto e sua consulta de pré-natal era bem básica. Como estava tudo bem, não ficava mais do que 15 minutos na sala. E não me orientar sobre o parto seria um sinal de que ela não me proporcionaria o parto que eu desejava.

Mas nunca vou saber isso. Faltando um mês para a data provável do parto, ela me avisou que tiraria férias e, lembro como hoje, pediu que esperasse por ela (como se fosse possível prever) e me passou o contato de um amigo. Isso foi o sinal de que não estava funcionando. Depois disso, nunca mais a vi. Mas fiquei órfã de obstetra. Como era mês de julho, muitos estavam de férias. Para piorar, eu, com convênio feito recentemente para que pudesse ter uma sonhada gravidez tranquila, tinha o objetivo de fazer um parto sem custo adicional. Mal sabia que isso é bem difícil quando se fala em parto humanizado.

Eu também me deparei com uma outra questão no final da gravidez: a Manu permanecia na posição pélvica, ou seja, com o bumbum para baixo e a cabeça para cima, sendo que já era esperado que ela tivesse virado. A grande maioria dos médicos não faz parto vaginal assim, por mais que hoje eu saiba que é possível sim. Mas eu fui em uma consulta particular com um dos mais famosos humanizados que existe em SP e ele estava, nesse ponto, com a maioria. Fez orientações para favorecer que a Manu virasse, porém foi categórico ao dizer que, caso não acontecesse, ele procederia com uma cesárea.

Fiz tudo que ele sugeriu: acupuntura, mocha, bola de pilates e nada. Hoje, acredito que esse “insucesso” era reflexo de tudo que eu estava passando. Talvez não tivesse incorporado de fato a ideia do parto que eu verbalizava e, assim, minha filha se mantinha do jeito que era mais confortável para nós. Estava cansada demais com tantos acontecimentos e contratempos desde a gestação anterior e me entreguei.

Por me afastar da possibilidade da Manu virar, fui procurar um obstetra colega de trabalho. Cesarista tradicional. Mas que imaginei que me daria a tranquilidade necessária por ser alguém com quem já tinha vínculo. Ele me fez acreditar que a Manu não passaria das 40 semanas e que era melhor deixar a data agendada por segurança com o convênio.

Não entrei em trabalho de parto. E não reagendei a data. Sequer o questionei. Na madrugada anterior à cirurgia, estava com contrações indolores a cada dez minutos. Mas não esperei o grande sinal do meu corpo e fui à cesárea.

Às 8h50 do dia 31 de julho, uns quarta-feira ensolarada e quente, nascia a Manuela. Ela demorou alguns poucos segundos para chorar. Eu estive a cirurgia inteira bastante calma, com meu marido do lado segurando minha mão, que estava presa. A Manu levou também um tempo para que eu a pudesse sentir. Pesaram-na, limparam, mostraram aos meus pais e, somente depois, foi colocado seu rosto ao lado do meu por alguns instantes, antes de levarem-na para os procedimentos padrões. Hoje, isso me chateia. Perdi a chance de receber minha filha da forma como todo ser que chega ao mundo merece ser recebido: nos braços de quem o carregou. Não pude amamentá-la e a minha omissão a expôs a uma série de procedimentos questionáveis e, inclusive, a levou a receber fórmula antes do meu leite, o que pode tê-la deixado alérgica por quase 3 anos. Por protocolo.


Manu nasceu às 8h50. Fui pegá-la em meus braços à tarde, cerca de 6 horas depois. Naquele momento, não tinha a noção do quão perigoso isso poderia ter sido para a sua saúde. Seu reflexo de mamar praticamente não existia. Ela tentava pegar o peito de qualquer jeito e se dava por satisfeita só de ficar com a boca aberta no meu seio. Eu simplesmente não sabia como ajudá-la e dependia das enfermeiras que pareciam até violentas para colocá-la na posição certa e me trouxeram um bico de silicone porque “diagnosticaram” que um dos meus bicos era muito curto. E eu não via leite sair dos meus seios nos dois primeiros dias. Hoje sei que as poucas gotas eram o colostro. Só não explodi de tensão porque a via calma e dorminhoca nas primeiras 24 horas. Minha primeira tentativa real de amamentar foi no dia seguinte, quando ficamos somente eu e ela e, naquele momento, com muita conversa, súplicas e declarações, ela pegou. Mas passamos o tempo todo no hospital sem muito colo e tranquilidade para amamentar.

No fim da noite, sempre ela era levada de mim para que eu pudesse “descansar”, enquanto a via pelo monitor. Hoje, me pergunto como me permiti a tantos erros e descuidos com a minha filha. Fico um pouco mais tranquila porque superamos e com 36 meses de vida, hoje nos classificamos em “amamentação prolongada”. Até me pergunto às vezes se esse desmame tarda a chegar devido ao vácuo no começo que ocorreu conosco. Não dá para saber.

Hoje, quero deixar registrado para a minha Manu o quanto se afastou do ideal a sua chegada e ela vai saber que a sua mãe comete erros (agora, com os seus 3 anos, ela ainda acha que eu sei e posso tudo). Não posso voltar atrás para fazer diferente, mas pude melhorar todos os nossos dias posteriores. Depois desse começo atrapalhado, onde nasceu uma leonina, nasceu também a mãe dessa leoa (como o Cacá me disse no nosso primeiro encontro). Com isso, posso te dizer, Manu, que todos os nossos dias desde a sua chegada na nossa casa, foram de muito colo, sling, carinho, conversa, música, toque e leite!

Às vezes, você me pergunta se sou sua amiga. Saiba que sou sua amiga e você é a melhor companheira que algum dia pude sonhar. Te amo mais!

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